What do you want from me? [rp fechado]

Quando meu pai avisou que havia comprado uma casa para nós eu fiquei meio em choque. Meu pai é o cara que vive em apartamentos com dois quartos e cozinha conjugada no centro, além disso tem uma geladeira cheia de comidas semi-prontas e roupas na lavanderia toda semana e tal. Então, veja bem, quando ele anunciou que comprou a casa minha primeira reação foi perguntar: "Uma casa com dois quartos e cozinha conjugada, no centro?" muito idiotamente. Ele riu de mim e me falou que era uma casa com quatro quartos, dois andares, uma sala, um escritório, cozinha longe da sala e um jadim, no subúrbio. Aí minha segunda reação foi perguntar quem iria cuidar da casa.

Aí sim veio a verdadeira notícia chocante. Veja bem, meu pai trabalha dando aulas de alguma coisa ligada à engenharia e fazendo consultorias. Ele é bem pago pela Universidade e tudo mais, mas é mais bem pago pelas consultorias que ele pode fazer em casa. Quando ele ficou sabendo da morte da minha mãe e que eu iria morar com ele, ele simplesmente largou da Universidade, "Não é como se eu usasse TODO o dinheiro que eu ganho, então eu economizei bastante durante esses anos. E as consultorias são o bastante para nós dois vivermos mais que confortavelmente na casa.", foi o que ele falou. E as consultorias permitiam que ele ficasse mais tempo em casa, logo, ELE cuidaria da casa.

"Isso vai ser um desastre." Eu pensei, parada em frente à casa nova com minhas malas enquanto meu pai pegava a chave com a corretora que dizia o quanto nós seríamos felizes naquela casa casa e todo aquele papo de corretores. A casa não era ENOOOORME, mas era a típica casa de subúrbio, cerquinha branca incluída, e era bonita e bem cuidada. Eu só duvidava que meu pai fosse dar conta de cuidar dela.

Pelo menos não era uma antiga casa abandonada e possivelmente assombrada, o que dava uns mil pontos pra ela. Aparentemente os antigos donos haviam se mudado pra outra cidade pra criar o bebê recém-nascido, o que também eliminava tragédia familiar e possíveis assombrações do curríulo da casa. Então minha maior preocupação, enquanto observava meu pai carregar as malas dele e eu mesma levava as minhas para dentro, era não morrer de intoxicação alimentar quando ele fosse cozinhar aquela noite.

Mas claro que isso não ia ficar assim por muito tempo. Quer dizer, por algumas horas foi tranquilo, eu ajudei meu pai a desempacotar seus livros, ele me ajudou com os meus livros e o computador e depois fomos passear um pouco pelo bairro, tomar um sorvete... E foi qando nós voltamos que eu o vi.

Estava parado na minha varanda, olhando para fora displiscentemente, como se estivesse esperando o carteiro, ou o entregador de pizza. Não era simplesmente o fato de ele ser um estranho na minha varanda que me fez arrepiar, mas sim aquele brilho prateado ao redor dele, porque simplesmente provava que não era simplesmente um estranho, mas o tipo de estranho que eu gostava de evitar, quando podia. Um fantasma. Pensei na minha mãe, enquanto o observava, ainda de costas para mim. Eu podia notar que suas roupas não eram antigas, então ele não podia ter morrido há muito tempo. Ele era alto e era obviamente um jovem, pelo estilo que estava usando.

Se minha mãe estivesse viva eu a teria chamado e ela o teria ajudado, porque, era um tanto óbvio que ele precisava de ajuda, eles sempre precisam. Mas agora ela era um deles, de certo modo eu acho, e iria querer que eu me aproximasse daquele rapaz. Eu respirei profundamente e alto, tentando tomar a coragem que precisava, mas eu não sabia nem por onde começar. Acho que o barulho da minha respiração chamou a atenção dele, porque ele me olhou parecendo meio triste e desapareceu, aparecendo ao meu lado em seguida. Eu estava certa, ela era um rapaz que deveria ter no mínimo 17 e no máximo uns 20 anos, era difícil dizer, e ele me encarava meio interessado ao notar que eu o estava vendo.

- Precisa de ajuda?

Perguntei, meio incerta, pensando que era isso que minha mãe queria que eu fizesse.

Se eu pudesse imaginar o que ia acontecer comigo quando eu morresse nunca teria desejado saber! Sério, porque aparentemente minha vida fora tão comum que não haveria nada que pudesse me segurar aqui, me manter preso entre os dois mundos! Devido a isso, eu nunca parei para pensar na palavra karma, e se algum dia eu tivesse ao menos pensado, não poderia dizer que tinha um. Não sei se para você isso está se tornando confuso, mas poder ter certeza de que para mim está. Vou tentar explicar para que eu e você possamos entender. E vou começar enumerando os fatos cotidianos da minha vida.

Eu tinha notas boas e não que fosse um nerd e gostasse demais de estudar, mas tinha certa facilidade. Tinha amigos, mas não era do grupo dos populares. Estava satisfeito com a primeira afirmação e não dava a mínima para a segunda. Não tinha namorada, mas isso não era uma coisa que me afetasse demais. Um casinho aqui e outro ali, coisas saudáveis. Tinha uma vida tranqüila e razoável e nunca reclamei quanto a isso. Me dava bem com os meus pais e minha irmã e....

Bom, recapitulando: boas notas, bons amigos, boa vida, boa família, tirando a tragédia que ocorreu alguns anos antes de eu morrer que acho que é o que está me segurando aqui. Resumindo: tudo era bom e para mim estava bom!

Agora, porque eu estou aqui sendo que aparentemente não há nada errado? Bom, eu vaguei, vaguei, vaguei e há algum tempo eu encontrei uma mulher muito bondosa no nosso plano, lá no intermediário por falta de uma palavra melhor, que tem tentado me ajudar. Segundo ela eu provavelmente estou aqui porque escondi a carta que minha irmã deixou antes de se matar e minha missão é entregar aos meus pais. Mas até ai tudo bem, quem interferiu fui eu. Eu só não entendo porque minha irmã não está presa aqui também, já que o seu penúltimo ato não foi concluído.

Mas enquanto eu não compreendia exatamente o que me segurava aqui, a mesma mulher que havia tentado me ajudar, acabou por me pedir um favor. Sua filha estava se mudando para Carmel, na Califórnia e pediu que, já que eu ainda estava entre os dois planos, que a vigiasse.

Fiquei vigiando a casa até que ela chegasse. Finalmente a vi chegando com o seu pai e fiquei pensando se me mostrava ou não. Entenda, eu nunca tinha assombrado ninguém e nem dado de cara com nenhuma pessoa “especializada” no meu caso. Portanto achei que tudo seria bem fácil. Eu ficaria de olho nela e contaria a sua mãe, que aliás, se esqueceu de me dizer que ela podia me ver.

Ela vinha da rua com o seu pai. Eu estava na varanda e percebi que ela me enxergava. Fiquei um pouco confuso com isso, meio sem saber o que fazer. Eu não estava preparado, sabe. E ela veio me analisando desde que conseguiu enxergar a casa. E eu gostei de vê-la, não sei porque, mas não me sentia bem que ela me visse. Seu pai entrou na casa e ela ficou, ainda me encarando, quando por fim ela perguntou se eu precisava de ajuda. A primeira coisa que veio na minha cabeça foi ”Você pode me ver?”, mas acho que perguntar isso seria bobo demais, já que era óbvio que sim, ela podia me ver.

-Hmm.... acho que não preciso. Estou surpreso que você pode me ver! Aidam, prazer!- Com um gesto automático estendi minha mão.

Ele pareceu bastante surpreso ao notar que eu podia vê-lo. Tipo, surpreso a ponto de ficar alguns segundos pensando no que dizer. O que foi meio fofo de observar, ou teria sido se ele não estivesse morto e enterrado de um modo bastante literal.

-Hmm.... acho que não preciso. Estou surpreso que você pode me ver! Aidam, prazer!

Calma, ele não precisa de ajuda? Mas fantasmas não existem por um motivo e esse motivo quer dizer que eles precisam da ajuda de pessoas como eu? Ai, mãezinha, por que eu nasci assim... Não que ele não devesse ser uma pessoa legal, mas eu simplesmente não sei lidar com fantasmas. Não sei e pronto. Eu sei que eu tenho esse dom, mas eu não nasci pra ele.

- Uhm... Mas... Vocês fantasmas não ficam aqui por algum motivo, quer dizer... Não é por isso que vocês são fantasmas? - Eu balbuciei só então notando a mão estendida do fantasma. - Ai que falta de educação. Katharine. - Eu não ia falar que era um prazer, que dizer, querendo ou não ele me causava arrepios nada prazerosos, mas estendi a mão para apertar a dele levemente também.

E eu vou te falar. Se ele ficou surpreso quando percebeu que eu podia vê-lo, a cara dele quando percebeu que eu também podia tocá-lo foi pelo menos umas sete vezes mais engraçada. E eu não pude deixar de dar uma risadinha.

Ok, se eu precisasse de oxigênio agora ele teria me faltado, certeza! Tudo bem que eu ofereci a minha mão num ato reflexivo, um costume humano que eu não perdi pelo jeito. Até porque eu não havia tido contato com nenhum humano depois da minha morte e os únicos humanos que eu poderia ter contato eram os tais de mediadores. E se dependessem deles eu não estaria mais aqui. Compliquei de novo não é? Mas não está fazendo sentido porque segundo a física a matéria é algo que tem massa. Se eu estou muito enganado eu não tenho massa. Mas ela diz que é uma coisa que ocupa espaço. Bom, ai o negócio ferra porque para os mediadores eu ocupo espaço, mas para humanos normais não... Ok, isso está se tornando estranho.

E eu não devia estar fazendo uma cara muito boa porque ela parecia a ponto de rir de mim. Talvez ela pudesse me ajudar também. -Bom, aparentemente sim, acho que ficamos aqui por algum motivo, mas eu ainda estou em dúvida se o que eu acho que é o meu motivo é o meu motivo.- Acho que eu iria deixá-la tonta. Eu sempre tive mania de complicar um pouco minhas explicações, torná-las complexas. Depois, ao pensar no que falei eu acabava por entender, mas meu interlocutor provavelmente não. Percebi que ela realmente não tinha entendido nada e continuei.

-Realmente, isso é o que acontece com os fantasmas, mas o que eu quis dizer é que eu tenho um motivo sim para ainda estar aqui. Pelo menos eu acho que é esse o motivo. Mas não é por isso que estou aqui.- Talvez agora ela entendesse. Ou não? Não sei, mas eu não estava ali pra ser salvo por ela. Pelo menos eu achava.

Decidi fazer o que sua mãe havia pedido. -Não sabia que você era mediadora. Aliás, quando vim pra cá não imaginei que você poderia me ver. Mas está gostando de Carmel?- Tentativa bem fraca, já que eu nunca tive que cuidar de ninguém. Só esperava que ela não achasse estranho.

-Bom, aparentemente sim, acho que ficamos aqui por algum motivo, mas eu ainda estou em dúvida se o que eu acho que é o meu motivo é o meu motivo. - Eu devo ter feito uma cara engraçada porque ele se apressou a continuar. - Realmente, isso é o que acontece com os fantasmas, mas o que eu quis dizer é que eu tenho um motivo sim para ainda estar aqui. Pelo menos eu acho que é esse o motivo. Mas não é por isso que estou aqui.

- Ok, Aidam, você não está me ajudando... - Eu disse, brincando com as pontas dos meus cabelos. Eu faço isso quando fico nervosa. Fantasmas me deixam nervosas. Fantasmas confusos me deixam à beira do desespero. - Deixa eu tentar acompanhar... Você tem um motivo pra ser um fantasma... Mas isso não tem nada a ver com o fato de você estar aqui... Aqui sendo o meu quarto? - Eu disse, como se uma daquelas lâmpadas de desenhos animados tivesse se acendido acima da minha cabeça. Não que eu estivesse num momento exatamente genial como os dos desenhos animados de qualquer modo. - Você só estava passeando então? - Eu dei uma risadinha involuntária.

- Não sabia que você era mediadora. Aliás, quando vim pra cá não imaginei que você poderia me ver. Mas está gostando de Carmel? - Ele disse meio... hesitante. Calma. Ele esperava me encontrar aqui? Ok, isso é um pouco mais assustador.

- Você... Sabe quem eu sou? - Eu perguntei meio embasbacada.

Bom, o certo aqui é eu dizer o porquê estou no quarto dela não? Mas não me lembro se a mulher disse pra não falar que eu viria cuidar dela e não o contrário. Eu sabia que não devia ter aberto a boca. Não ia dar muito certo. O negócio então era falar a verdade. Mas eu duvido que ela ligue que eu fale a verdade, então... Ok, vamos por partes.

-Bom, aparentemente eu não estou só passeando. Eu tenho certeza que é culpa da minha irmã o fato de eu estar aqui ainda. Na verdade é culpa minha também porque eu me meti. E agora perdi a maldita carta. Mas não tenho certeza se posso resolver meu problema só entregando a carta e...- Mais um hábito básico que pelo jeito não perdi. Eu estava tagarelando e andando para lá e para cá no quarto de Katharine. Flutuando para ser mais preciso, quando eu olhei para ela de novo e a vi me olhando com cara de ”Esse fantasma está louco?” Parei por uns minutos pensando em como recomeçar. Estava vendo a hora que ela ia me chutar por encher o seu saco dessa forma. E também eu poderia ir embora não é, já que eu vi que ela estava bem. Mas e se ela me pedisse pra vir de novo? Eu não iria negar o pedido e eu estava me sentindo incrivelmente bem aqui. Seria interessante ter alguém humano para conversar. A não ser que ela quisesse me atravessar de uma vez.

Percebi que havia me perdido em pensamentos de novo e Katharine estava me olhando e esperando explicações. Ela tinha perguntado se eu sabia quem ela era. Passei a mão na nuca e olhei para ela. Bom, era hora de falar.

-Vamos dizer que eu sei sim quem você é e que vim aqui a pedido de alguém para lhe fazer companhia.- Ok Aidam, menos evasivo, mas objetivo. Ela provavelmente não estava entendendo nada. -Sua mãe me pediu para ver como você estava e eu vim, pois ela tem tentado me ajudar bastante. Claro que não da forma como um mediador ajudaria, mas tem. Só que eu não imaginei que você pudesse me ver. Por isso estou me enrolando um pouco e...- É melhor eu calar a boca e deixar ela fazer as perguntas.

Meu deus.

Eu acho que nunca conheci alguém tão confuso na vida. Mas era divertido observar enquanto ele falava as palavras desconexas e então parava, como se tentasse entender se o que ele falava estava fazendo sentido. Era meio fofo o modo como ele segurava a mão uma na outra, as esfregando e olhava pra mim, de vez em quando, como se esperasse que eu houvesse entendido. Coisa que eu não havia.

E quando ele passou a mão pela nuca e me olhou, como se tivesse chegado a uma conclusão eu quase podia esquecer que ele era um fantasma e pensar o quanto ele era... Atraente... E fofo.

-Vamos dizer que eu sei sim quem você é e que vim aqui a pedido de alguém para lhe fazer companhia.Sua mãe me pediu para ver como você estava e eu vim, pois ela tem tentado me ajudar bastante. Claro que não da forma como um mediador ajudaria, mas tem. Só que eu não imaginei que você pudesse me ver. Por isso estou me enrolando um pouco e...

Ok, eu não sabia se ficava em choque. Se chorava. Se saia correndo... Acho que foi por isso que eu acabei soltando uma gargalhada alta, me sentando no chão, com as pernas cruzadas, me curvando enquanto ria.

- Issto é tão. Típico. Minha mãe... Como ela está? - Perguntei, um tanto espantada com a minha reação. Eu ainda ria nervosamente.

Quando eu parei de falar, eu percebi que ela me olhava de dois modos, alternadamente. Primeiro, igualmente confusa, por eu ser tão péssimo em explicações e depois como se tivesse dó ou achasse bonitinho. Qualquer homem, por mais sensível que seja não gosta muito que uma mulher o ache fofinha, como se fosse um cachorrinho. Ainda mais quando ele a acha bonita. Mas... EPA! Vamos esclarecer uma coisa primeiro. Eu sou um fantasma, e continuo sendo homem, mas não da mesma forma. Portanto não faz sentido eu achar uma mulher bonita. Ainda mais ela sendo humana e viva. Ok, isso vai se tornar mais confuso ainda e é isso o que eu não quero. Se eu tiver que falar de novo e ela fizer essa carinha de dó, acho que não vou gostar. Se bem que, o que eu poderia falar? Não sou de falar grosso com as mulheres por ficarem com dó de mim.

Mas voltei a prestar atenção nela, que ao me ouvir falar da mãe, ficou em estado de choque e teve a reação que eu menos imaginava: sentou-se no chão e começou a gargalhar. Isso mesmo, gargalhar. Eu fiquei parado, onde estava esperando uma reação dela depois desse acesso de riso.

Quando ela conseguiu parar, me perguntou sobre sua mãe e de como ela estava. Bom, eu sabia que isso aconteceria então eu tentei me acalmar também, para ver se conseguia explicar alguma coisa de forma coerente. Eu não poderia começar com ”Sua mãe está morta, mas bem!” que me veio na cabeça. Mas é incrível como nessas horas coisas idiotas passam por ela. Sentei-me no chão a sua frente, cruzando as pernas também e comecei a falar.

-Bom, sua mãe está bem. Bastante preocupada com você. Não tenho muito que contar e não sei se é reconfortante, mas sei mais sobre você do que sobre ela, apesar de ter passado mais tempo com ela. Ela fala bastante de você, com muito carinho e agora eu entendo o que ela quis dizer com você se dar bem com o seu dom. É estranho que ela não tenha me falado, já que me pediu pra vir aqui. Mas talvez tenha feito de propósito, achando que você pudesse me ajudar. Mas me conte, para que eu possa contar a ela, já conseguiu cumprir alguma tarefa?- Sorri, esperando sua resposta. Talvez ela não pudesse gostar que a mãe tivesse me falado coisa de criança dela ou coisas constrangedoras. Na verdade não falou, mas quando as mães falam de seus filhos, temos que desconfiar.

Aidam se sentou à minha frente depois de passar mais um tempo pensando no que falar.

-Bom, sua mãe está bem. Bastante preocupada com você. Não tenho muito que contar e não sei se é reconfortante, mas sei mais sobre você do que sobre ela, apesar de ter passado mais tempo com ela. Ela fala bastante de você, com muito carinho e agora eu entendo o que ela quis dizer com você se dar bem com o seu dom. É estranho que ela não tenha me falado, já que me pediu pra vir aqui. Mas talvez tenha feito de propósito, achando que você pudesse me ajudar. Mas me conte, para que eu possa contar a ela, já conseguiu cumprir alguma tarefa?

Claro que mamãe iria querer que eu fizesse alguma coisa que não fosse ignorar os fantasmas. Não que ignorar um fantasma fosse possível, já que se eles realmente quiserem falar com você possuem modos muito injustos de te perseguirem e te fazer escutar. Mas você podia muito bem escolher não fazer nada, como eu fazia quando os levava até minha mãe. Então, é claro, que ela iria querer que eu começasse a fazer alguma coisa, agora que ela estava morta. Nada mais típico do que ela mandar um fantasma até mim. Me pergunto porque o Aidam em todo caso...

- Minha mãe deve ter ficado ainda pior depois de morta... - Eu ri e ele me olhou de forma estranha. - É que ela não era muito direta quando viva e vocês, mortos, se eu aprendi algo, costumam deixar a capacidade de ser diretos no túmulo. Ou acham que nós podemos ler as mentes de vocês também. Sem ofensas... Mas... Bem, se ela te pediu para vir até aqui só pode querer que eu te ajude. - Suspirei. - Eu nunca ajudei um fantasma... Não sozinha pelo menos... Sinto muito se isso te desaponta, mas eu posso... Tentar. Qual é o motivo pelo qual você deve estar aqui mesmo?

Conforme eu fui falando pude perceber que tinha algo realmente proposital ali. Sim, porque a mãe dela não poderia me mandar pra vê-la só por ver, ainda mais sabendo que a filha era mediadora. Com certeza que não. Ela tinha a intenção de que a sua filha me ajudasse. Essa era boa, ter intenção pelos outro, há! Mas eu já não estava mais acreditando que ela havia me mandado ali só pra falar um oi pra Katharine e ver se ela estava escovando os dentes direito, fazendo a lição de casa, dormindo cedo e tal. Não que eu estivesse bravo com ela por isso, só estava me achando um pouco idiota por não ter percebido.

E quando Katharine falou eu teve mais certeza ainda. Pelo jeito ela conhecia a mãe o suficiente pra saber que ela queria isso da filha e que mandar-me ali fora matar dois coelhos com uma cajadada só. Eu via como a menina estava e ela me ajudava. E assim que ela terminou de falar que a mãe provavelmente queria isso, começou a me mediar. Era engraçado como ela também não era tão direto e sucinta assim. Claro que eu ganhava na confusão, mas ela não ficava tão atrás. Disse que nunca havia ajudado um fantasma e que eu seria o primeiro, que iria tentar. Pediu então que eu contasse o motivo pelo qual ele achava estar ali ainda.

Me levantei e comecei a andar pelo quarto de novo, de um lado para o outro, pensando em como começar sem complicar nada. Passei a mão na nuca e deixei meus pensamentos se organizarem. Lembrei do suicídio de minha irmã, de como eu escondi a carta que ela deixara, de como cinco anos depois eu tinha ido buscá-la no lugar em que havia enterrado a arca com meus outros amigos, de como a jogara dentro do mar em uma garrafa e depois na volta, naquela curva tão fatídica.... PAH! Ok, sem encenação. Sentei-me a sua frente de novo e comecei a contar a minha historia.

-Bom, aparentemente, tudo começou com o suicídio de minha irmã.- Não falei como ela havia se matado. Achava que não precisava entrar em tantos detalhes, apenas contei que ela se matou e que havia deixado uma carta. -Eu cai na besteira de esconder essa carta dos meus pais, para que eles não soubessem que fora suicídio, pois a morte poderia ser confundida com acidente.- Não gostava muito de lembrar disso, mas continuei contando que não queria que meus pais ficassem mais arrasados do que já estavam por perder uma filha e que decidira esconder a carta junto das coisas que meus outros quatro amigos esconderam em uma arca e enterraram na encosta da praia de Carmel. - Cinco anos depois, Brian, um de meus amigos me ligou, dizendo que eles iriam desenterrar a arca. Eu fui até lá e quando peguei a carta coloquei numa garrafa e joguei no mar.- Katharine olhou com uma cara meio estranha pra mim.-Eu sei que foi uma idiotice, mas eu ainda não tinha coragem de entregar pra eles. O fato é que voltando pra casa eu sofri um acidente.- Eu devo ter feito uma cara um pouco sofrida, mas mesmo assim continuei.-Aparentemente, eu estou aqui por causa da maldita carta. Mas eu fico pensando, minha irmã teria que estar por aqui também não é? Pois a carta dela não foi entregue!- Ao falar isso em voz alta, me pareceu o mais certo.

-Bom, aparentemente, tudo começou com o suicídio de minha irmã. Eu cai na besteira de esconder essa carta dos meus pais, para que eles não soubessem que fora suicídio, pois a morte poderia ser confundida com acidente. (...) Cinco anos depois, Brian, um de meus amigos me ligou, dizendo que eles iriam desenterrar a arca. Eu fui até lá e quando peguei a carta coloquei numa garrafa e joguei no mar. Eu sei que foi uma idiotice, mas eu ainda não tinha coragem de entregar pra eles. O fato é que voltando pra casa eu sofri um acidente. Aparentemente, eu estou aqui por causa da maldita carta. Mas eu fico pensando, minha irmã teria que estar por aqui também não é? Pois a carta dela não foi entregue!

Enquanto ele falava, eu ia reagindo ao que ele falava. Primeiro, drama de família, clássico. Irmã suicida, irmão quer poupar os pais, acontece. E não é todo mundo que sentiria culpa o bastante por isso pra ficar preso aqui, o que com certeza prova que ele não fez por mal. Em segundo lugar... JOGAR A CARTA NO MAR? O que ele acha que é? Um náufrago e alguém do outro lado do oceano ia achar a carta e mandar de volta assim, pra facilitar o meu trabalho? É, essa carta com certeza estava fora de questão... A não ser que reaparecesse por mágica. Ok, Katharine, pensar... Pensar antes de falar qualquer coisa do gênero: "mas como você é burro!" até porque ele não sabia que ia morrer e precisar da tal da carta depois, mas mesmo assim...

- Ok... Então... Uma carta perdida pra sempre... Culpa... E uma provável irmã fantasma perdida por aí... Eu não sei nem por onde começar... Cara você é um casinho complicado, sabia? - Eu fechei os olhos, tentando pensar. - Bem, acho que o certo seria começar pela sua irmã então... Se ela realmente ficou presa aqui por causa da carta eu digo... Existe uma chance de ela estar presa a Carmel e uma chance de ela ter... Vagado por aí... O que vai complicar ainda mais... - Abri os olhos, o encarando meio insegura. - Aidam... Onde... Onde sua irmã morreu?

Esse era o meu medo. A reação óbvia de um mediador ou de qualquer um que pudesse ouvir a minha história. Todos me olhariam primeiro com cara de dó. Uma história clichê do começo ao fim, que fazia a pessoa se condoer. Então, ao chegar à parte da carta, qualquer um me olharia com cara de: ”Cara, você é um idiota?” Não que eu tenha contado pra alguém a historia toda, mas a reação da minha ouvinte estava sendo exatamente do jeito que eu imaginara. Sério, desse jeitinho mesmo. Quando eu mencionei a carta e que ela fora jogada ao mar, senti uma hesitação sabe, como se ela quisesse me repreender. Fora o que eu disse. Era de se esperar essa reação. Mas ela foi bastante legal em não me criticar ali, naquela hora. Eu sabia que se quisesse a ajuda dela, um dia a critica viria. Mas foi bom não ser agora, pra variar.

Então a pergunta crucial veio. Eu sabia que teria que enfrentar aquilo uma hora ou outra, e era bom que fosse o mais cedo possível. Olhei para Katharine demoradamente e então suspirei. Um mero reflexo do que poderia ser um suspiro um dia. Encaminhei-me para a janela de seu quarto e me sentei no parapeito, com as costas viradas para ela. Preferia não ter que encará-la ao contar isso.

Fiquei mais um pouco em silêncio e senti que ela se aproximava, talvez para me ouvir melhor. Era mais fácil começar logo, antes que eu perdesse a coragem. -Claire era a minha irmã mais nova, a minha protegida. Éramos muito unidos e eu a amava demais. Tínhamos as nossas desavenças, mas nada que fosse muito sério. Quando entramos na idade mais critica, como papai dizia, eu tinha que me segurar, pois era muito ciumento. Ela estava se tornando uma linda garota e em breve seria uma linda mulher.- Havia um resquício de sorriso na minha voz, bastante perceptível. Mas ele acabou por sumir ao final de minha frase.

-Sabe, eu sempre fui protetor, mas de uma forma extremamente discreta. Hoje eu gostaria de ter sido um pouco mais chato e em vez de ter só alertado, gostaria de ter partido para a ação.- Meus punhos se fecharam involuntariamente ao lembrar de tudo e minha voz foi ficando mais dura. -Claire se apaixonou por um cara que estava no ultimo ano em seu curso na Universidade de Carmel. Desde o começo eu não havia ido com a cara dele, mas ela parecia tão feliz que eu decidi tentar enxergar pelos olhos dela. Meus pais também não gostaram de inicio, mas era difícil tirar alguma coisa da cabeça de Claire quando ela não queria.- Fui ficando cada vez com mais raiva, fazendo as cortinas do quarto de Katherine balançarem agourentamente. Ela me pediu calma e eu fiquei um tempo em silêncio, pois agora não podia parar.

-Me desculpe Katherine, eu ainda me culpo por tudo. Mas preciso continuar, agora que comecei.- Parei por alguns segundos e então ela veio sentar ao meu lado.-Bom, o caso todo é que ele estava terminando seus estudos e com certeza iria embora. Eu tentei mostrar isso para Claire, mas ela não queria enxergar. O canalha deve ter feito varias promessas, pois uma semana antes de ir embora de Carmel, Claire se entregou para ele. Eu sei, pois estava na carta. Mas ela ficou tão deprimida depois disso, depois dele ter ido embora, que duvido que ela tenha falado pra alguém, mesmo pra alguma amiga mais intima. Ela foi definhando e emagrecendo bastante. Quase não falava com ninguém. Então, um dia ela saiu de casa com uma falsa euforia, dizendo que iria pra uma festa na praia. Eu achei estranho, pois não estava sabendo de festa nenhuma. Mas talvez ela fosse apenas se encontrar com as amigas. Fiquei inquieto a noite toda e então, quando já era quase 23h eu fui ao seu quarto e lá no criado mudo tinha a carta. Nela ela contava o porque havia se matado e o quanto tinha vergonha disso. Fiquei desesperado, e sem avisar meus pais, peguei o carro e fui até o penhasco. É claro que já era tarde demais...

Caramba...

Se ele tivesse tirado a história dele de um daqueles romances de banca de revista não tinha encontrado tantos clichês, o que, na realidade me fazia acreditar que ele não estava inventando nada. Até pelo modo como aquilo o afetava. Dava pra ver direitinho o quanto ele ainda se culpava por tudo. Mas convenhamos, aquilo não era culpa dele... E claro, eu não ia ficar calada vendo alguém se culpar por atitudes dos outros.

- Olha, quem fez as escolhas erradas foi sua irmã, não você. - Eu disse pensando se colocava uma mão no ombro dele, mas desistindo na metade do caminho. - Ela foi responsável por todos os erros delas. Quer dizer... Você não pode se culpar pelas idiotices que ela fez da vida dela...

Eu juro que não queria ofender, então porque ele está me olhando com essa cara?

Fiquei um bom tempo em silêncio, ainda pensando em como era difícil falar naquilo. Eu sabia que seria terrivelmente doloroso, mas não tanto. Teria que me controlar pra não sumir de uma vez por todas e aceitar o castigo que me fora imposto, de ficar vagando na terra para pagar o que eu não pude evitar. A mãe de Katharina havia me falado para parar de pensar que eu ainda estava na Terra por minha irmã ter se matado e que estava na cara que era pela carta. Eu sabia que era pela carta, já havia repetido isso várias vezes e em voz alta, mas ainda achava que não era só por causa disso. Ao falar de Claire, pensei mais uma vez no porque dela não estar vagando pela terra também. Era bem estranho.

Quando Katharine viu que eu não continuaria mais, resolveu falar. Eu não sei o que esperava. Não sei mesmo. Palavras de conforto, dizendo que eu e Claire éramos dois coitados? Que não iria ouvir nenhuma repreensão? Ok, a repreensão eu tinha certeza que viria. Talvez, quando tomássemos mais intimidade ela me xingaria de idiota. Era o que eu esperava, não é? Mas nada do que viera a seguir.

-Olha, quem fez as escolhas erradas foi sua irmã, não você. – Ela falou, colocando a mão em meus ombros. Eu me virei rapidamente, meu “sangue” fervendo. Quem ela era pra falar da minha irmã assim. Ela mal a conhecera, mal sabia o que a menina tinha passado. Agora é que eu não contaria o restante da história, para ela não começar a ter dó. Eu não queria isso. Ela pode ter sido responsável por alguns erros, mas todos os envolvidos erraram também. Não era assim que as coisas funcionavam. Eu mal prestei atenção em tudo o que ela falou por fim, e minha expressão não deveria ser das melhores.

Comecei a ficar muito nervoso, e ela não tinha noção o quão ruim aquilo poderia ser. Mais uma vez as coisas começaram a se manifestar ao meu redor. Me levantei do parapeito e parei de frente para ela, chegando muito perto de seu rosto. Eu deveria estar emanando correntes raivosas e se ela pudesse sentir, veria que eu estava queimando de ódio. Eu não era assim, tinha que me controlar. Abri a boca para falar, mas antes que eu pudesse fazer qualquer besteira, sumi de seu quarto.

Eu juro que não queria ofender. Juro mesmo.
Mas ofendi e muito, aparentemente. Pelo modo como ele me encarou e o ambiente ficou... Carregado.
Eu não entendia como podia ser tão ofensivo falar uma verdade simples assim. Mas é aquilo que sempre dizem, né... A verdade nem sempre é o que se quer ouvir. Mas não precisa olhar desse modo... Assassino. Precisa?
Eu ia falar algo, mas de repente ele sumiu.
Graças a Deus, eu acho, eu estava ficando realmente com medo... Mas... Eu tinha que ajudá-lo, não é? Ai, por Deus... Que saco.

- Ótimo. Foge, aí eu não preciso ajudar você... - Resmunguei, voltando para minha cama.

Eu já disse que sou bastante calmo, mas tenho o estopim curto? Ok, bem complexo e contraditório. Mas o negocio é que eu posso ser bastante tolerante, só que certas coisas esgotam minha paciência ou tranqüilidade com mais rapidez. E o que acontecera no quarto de Katharine fora uma delas. Eu não podia fazer aquilo com quem supostamente iria me ajudar. E com certeza fazia parte do trabalho dela, mencionar o quão burro eu fora e me mostrar o que eu fizera de errado, para que pudéssemos consertar.

Nesse pacote também viria criticas a minha irmã, parte do motivo de tudo isso. Eu teria que agüentar. Fiquei apenas observando Katharine ficar estupefata com o meu sumiço e com a minha cena, até que ela começou a resmungar. Eu poderia ter ficado possesso, mas o jeito dela me fez rir. Teria que deixar o orgulho de lado e voltar para lá. Antes de voltar a aparecer ela resmungou de forma mais clara: - Ótimo. Foge, aí eu não preciso ajudar você... –

Eu segurei uma gargalhada de onde estava, com medo de que ela me ouvisse (ele ainda não tem muita noção ao lidar com os humanos, nesse aspecto). Então, coloquei uma expressão mais séria no rosto e voltei ao quarto repentinamente. Fui falando de supetão -Ok, eu não sou desse jeito. Acho que fui bastante mal educado e você só estava querendo me ajudar. E eu realmente preciso de sua ajuda.- Acho que ela não esperava que eu voltasse assim, tão rapidamente. Mas que foi engraçado foi. Acho que eu deveria fazer isso mais vezes com os humanos que podem me ver, pra me divertir.

Katharine pareceu ficar sem palavras por um tempinho e então eu me sentei ao seu lado e segurei suas mãos. Agora eu tinha que ser gentil e essa era a minha verdadeira face. -Mais uma vez, me desculpe. Eu preciso de sua ajuda.- repeti.-Você pode me ajudar?- sorri fracamente para ela, ainda segurando suas mãos.

Sério, como a pessoa pede ajuda e depois ignora totalmente esse fato e foge assim... Oras, eu não tenho obrigação de ajudar alguém que não quer ser ajudado, porque, aprendi com minha mãe, a verdade é sempre parte da ajuda. Muitos fantasmas ficam aqui para descobri-la, outros para contá-la e eu desconfiava que o caso de Aidam envolvia ambas as situações e encarar seus erros, assumir o que é culpa dele e o que não é. Portanto, se ele não estava pronto pra ouvir essas coisas problema dele né? Eu estava com esses pensamentos da cabeça e ainda resmungando sobre como ele pôde ter sido tão irrascível e voltando ao meu quarto, mas ao me virar dei de cara com ele.

O grito que eu dei assustou até a mim mesma e eu dei graças a Deus que meu pai provavelmente estava no escritório no andar de baixo, trabalhando loucamente para ouvir o grito. Aidam, no entanto parecia ter se divertido com a minha reação. Como se fosse anormal alguém se assustar quando alguém aparece de repente na sua frente. Minha reação ia ser gritar com ele, quando ele começou a se desculpar e eu admito que aquilo me pegou desprevenida. Quer dizer, praticamente segundos atrás ele parecia que iria me odiar eternamente, então eu simplesmente sentei na cama e fiquei pensando no que dizer.

Ele pareceu notar minha falta de reação, porque se assentou ao meu lado e segurou minhas mãos gentilmente, voltando a pedir desculpas e pedindo, mais uma vez a minha ajuda. Eu simplesmente passei mais alguns minutos idiotamente olhando para as minhas mãos entre as dele, pensando em como ele não era tão frio quanto os outros fantasmas e aquilo era estranho. E em como, por toda a minha vida, eu jamais havia tido um rapaz tão perto assim, me tratando tão gentilmente, sentado na minha cama, segurando as minhas mãos e sorrindo pra mim daquele modo, e no quanto isso fora idiota, porque ser uma aberração não devia ter me impedido de viver, era o que minha mãe me dizia, e agora eu notava que era verdade e por segundos esqueci que ele era um fantasma pedindo a minha ajuda e me deixei corar e gaguejar.

- Q-quê? C-c-como? - Eu perguntei muito idiotamente antes de sacudir a cabeça e deixar todos aqueles pensamentos saírem ao encará-lo e ver aquele brilho azulado ao seu redor. Um fantasma, droga, Katharine... - Ah... Uhm... Eu acho que... Bem, eu posso tentar... mas vai ser difícil... Quer dizer... A gente mal sabe por que você está aqui não é? - Eu mordi meu lábio inferior levemente. - E, Aidam, quando eu falei aquilo... Sobre a sua irmã... Eu não quis ofender... Eu só... Eu não acho que você teria sido capaz de mudar essas coisas... Quer dizer... Você não podia tomar decisões por ela... Eu realmente não quis ofender... Sinto muito se ofendi.

”Ok Aidam, você merece esse silêncio tão grande. Aliás, você merece receber um não bem grande por ter sido tão idiota e nervosinho.” Após eu ter me desculpado e falado tudo o que eu estava sentindo com uma sinceridade enorme, eu esperava uma reação mais enérgica por parte de Katharine. Esperava que ela gritasse comigo me chamando de abusado por estar em sua cama segurando suas mãos e de sem educação por ter agido daquela forma e ter aparecido repentinamente em seu quarto não uma, mas duas vezes. É as coisas pro meu lado não deveriam estar tão boas. Ou então, eu esperava a resposta que eu tanto queria e pela qual eu estava ali. Que sim, ela iria me ajudar. Mas esse silêncio? Estava me deixando um pouco ansioso.

Ela passou esse pequeno tempo em silencio, que para mim parecia enorme, olhando para nossas mãos. Eu deveria soltá-las? Se soltasse bruscamente seria mal-educado mais uma vez e se não soltasse continuaria sendo abusado. ”Fala alguma coisa, antes que eu fique louco de tanto imaginar uma resposta.” Tentei manter meu rosto o mais inexpressivo possível, talvez com a impressão do pequeno sorriso que eu havia dado depois do meu pedido. Não poderia deixar transparecer minha pressa e minha ansiedade.

Então ela finalmente falou e não pude deixar de perceber que seu rosto estava extremamente corado. Será que ela estava com vergonha de algo que falou? Quem deveria estar envergonhado ali era e eu. E bem, na verdade ela não falou. Gaguejou para ser mais preciso, mas já era um começo. Um bom começo, aliás, pois o fato de gaguejar mostrava que ela estava nervosa, mas não brava. Meu sorriso voltou a se estender por seu rosto enquanto ela sacudia a cabeça como se para sair de um transe, e voltava a me encarar. - Ah... Uhm... Eu acho que... Bem, eu posso tentar... mas vai ser difícil... Quer dizer... A gente mal sabe por que você está aqui não é? – Ela estava muito nervosa e eu não entendia o porque. Achei encantadora a forma como ela mordeu o lábio inferior involuntariamente. Ela então voltou a falar, pedindo desculpas e tentando justificar os meus atos. Num ponto ela estava certa. Muitas coisas eu não poderia mudar, mas eu sabia que teria conseguido mudar algumas coisas pequenas. Mas não ia insistir naquilo, pelo menos por hora.

Ainda estava segurando suas mãos e mais uma vez não fazia sentido soltá-las. -Eu fico muito grato que você vá me ajudar. Não sei até onde isso vai dar, mas se eu ver que pode te prejudicar, juro que paro onde quer que estivermos e vou embora.- Ela fez menção de falar e eu soltei uma das mãos pedindo para ela esperar. -Só tem um problema, você vai ter que me agüentar no seu pé por um tempo.- Sorri mais uma vez da brincadeira e soltando suas mãos desapareci.