Kids, Ghots and Playboys! (Fechado)

Eu não deveria ter feito aquilo. No que é que eu estava pensando? Hm, nada , na verdade, mas mesmo assim. Eu não poderia começar a me dar o luxo de jogar bancos de igrejas nas cabeças dos mortais que me tiravam do sério, porque as chances de um deles bater as botas e ficar me azucrinando são bem altas. Sim, você pode pensar que não, mas, atualmente, o pessoal anda muito apegado às coisas materiais e tudo mais.

E sabe, nem foi justo com ele. Ao contrário do que eu dissera, ele tinha um cabelo bem bonito e apesar de depois eu ter ido ao banheiro feminino do colégio tentar arrumar meu cabelo, tenho que admitir que ele estava certo: meu cabelo era estranho.E mais, ele não foi idiota o suficiente para chegar perguntando: “E aí, por que você ainda está aqui? O que está te prendendo?” Ahm, dã! Você acha que se eu soubesse eu ainda estaria aqui, múmia?!

Fui caminhando em direção ao parque enquanto pensava em tudo isso. Era um dia bonito. O céu estava azul e eu podia sentir o sol atravessando meu corpo – é, você se acostuma com essa sensação. Ok, pensando melhor, ele foi idiota. Ele foi idiota o bastante para me irritar. Em outras épocas nada aconteceria, mas oi, eu sou um fantasma. O que ele queria? Que eu sumisse chorando? Não, não comigo. Pelo menos eu não faria isso na frente dele.

O parque não estava muito cheio. Havia algumas crianças brincando no balanço e outras mais afastadas, brincando no escorregador. Invenções divertidas, devo acrescentar. Caminhei pelos brinquedos – ou atravessando, se você preferir – e parei em frente a uma menininha. Ela tinha os cabelos loiros e ondulados e seus olhos castanhos pareciam observar tudo ao seu redor, concentradamente. Tinha alguma coisa nela que me fazia lembrar de minha irmã. Talvez o jeito como os cachinhos balançavam quando ela se mexia. Ou o sorriso no rosto.

Abaixei-me lentamente, mas acabei caindo. – Droga. – Apoiei a cabeça em meus joelhos e continuei a observar. Ela parecia tentar construir alguma coisa com gravetos do chão, mas não estava sendo muito bem sucedida. – Não, assim não. Você tem que colocar esse aí ali. – Murmurei.

E de repente eu me dei conta. Não era com minha irmã que ela se parecia. Era comigo.

Lá estava eu. Com uma lata de refrigerante na mão e olhando fixamente para a televisão, onde era transmitido os X-GAME’s. No momento estavam sendo alternados o campeonato de Skateboard e Patins. Eu urrei quando Zach Murphy capotou de uma grade e saiu ralando os joelhos no chão. Ele era péssimo. Em compensação, Bob Burnquist detonou na modalidade Skate vertical, fazendo um 900 no ar, combinado com girada dupla com back.
- Wooooo! – Urrei de novo. Aquilo era bom demais.

Cerca de vinte minutos se passaram e um corpinho pequeno e delicado veio se alojar no meu colo na poltrona onde eu estava e me abraçou de forma dengosa que só poderia ser para pedir algo. Era Summer, minha irmã mais nova. Ela parecia aborrecida e fazia um biquinho quanto jogou seus bracinhos em volta do meu pescoço. O que seria? Huh? Parque? Agora? Nesse momento? Damn, certo. O problema de você ter uma irmãsinha irresistível como Summer, é que você NUNCA consegue negar nada a ela. Ainda mais quando você é praticamente o homem da casa, já que não considera o cara que casou com sua mãe depois de seu pai morrer, um homem legal. O cara é um maldito, dude!

O fato óbvio é que eu não resisti em levá-la até o parquinho, para que ela pudesse brincar “adequadamente?”. Minha mãe não estava ali no momento, então só sobrava eu. Calcei meus tênis, dei uma passada no quarto para arrumar o cabelo - eu REPITO: não sou gay. Sai fora, man! -, fiz ela calçar a sandália dela e nós saímos. A rua estava agradável. Não era muito longe da nossa casa até o Parque, então fomos andando mesmo. Segurei forte na mão de Summy para que ela não saísse correndo para o meio da rua e fosse (que Deus a livre) atropelada.

Chegamos lá alguns minutos depois. A grama verde e toda a atmosfera saudável era agradável. Eu gostava de ir lá também. Era um bom lugar pra flertar e tal, se é que me entende. Summy foi direto para os brinquedinhos coloridos. Ela tinha uma preferência desesperadora por brinquedos perigosos, mas eu a obriguei a brincar apenas com os propícios para a idade dela. A pequena tem um gosto por perigo que é inexplicável. Não sei de quem ela puxou isso, tsc, tsc.... Depois de alguns momentos ela avistou um carrinho de sorvete. Eu quase fechei os olhos e esperei que ela viesse. Era típico; quase um ritual tomar sorvete sempre que vinha até o parque. Sorry quando ela correu até mim e pediu. Quando eu voltei com chocolate a primeira coisa que ela fez foi manchar a blusa dela. Fiz uma careta e me abaixei pra tentar limpar. Caso perdido. Essa aí já era. Reclamei com ela e disse que mamãe ia dar uns petelecos por causa disso, mas ela só parecia se divertir com meu mau-humor momentâneo. Rolei os olhos e me afastei para comprar um sorvete para mim mesmo; não sem antes falar para ela quais os brinquedos mais seguros, claro. Eu não podia simplesmente confiar no instinto perigoso dela. Aqueles parquinhos pareciam inofensivos, mais nem tudo que parece é...

Comprei um sorvete de creme para mim. A tinha três crianças na minha frente, então tive que esperar alguns minutos. Um pirralhinho furou a fila, mas eu discretamente cuidei disso, catando ele pelos cabelos e colocando-o atrás de mim. Hey, não fui violento! Puxei devagar e ele só reclamou um pouco. Não abriu o berreiro nem nada, mas ainda assim reclamou. Fiz uma careta pra ele e segui. Quando eu estava voltando, vi as costas de Summer. Ela estava ajoelhada na grama, brincando com algo no chão. Caminhei até lá para falar pra ela não por nada na boca que não fosse o sorvete, apesar de saber que ela era esperta demais para não fazer isso. Quando estava mais perto, avistei mais uma pessoa junto a ela. As duas estavam conversando, mas eu não podia ouvir o que era até então. Depois de mais alguns metros, parei onde estava, um pouco paralisado. Porque a pessoa que estava perto de Summy era um fantasma. Aliás, era a fantasma que eu menos queria ver no momento. Alice. Acelerei o passo e cheguei, finalmente, até lá.
- Summer, que tal você ir para a casinha de brinquedos, hum? – perguntei, apontando para uma casinha de plástico relativamente grande com bolas e outras coisas dentro. E só então olhei para ela. O que eu vi no seu olhar me agradou.

Eu sei que eu tenho que parar de ficar falando com todo mundo. Eu não sei no que Carmel me transformou, mas fez um bem danado para o meu círculo social. Se você acha que jogar bancos em pessoas conta como um ponto positivo, então ponto para mim! Mas foi pelo fato dela não poder me ver que fez com que eu abrisse a boca. Para ela seria só mais um dia no parque, brincando e se divertindo, sem saber estar sendo observada por alguém.

- Ahn... Obrigada! - Ela se virou, procurando por mim. Quando não achou, sorriu, deixando à mostra aqueles dentinhos brancos e pequenininhos de criança.

- De nada.

Espera. Tem alguma coisa errada. Tem alguma coisa muito errada.

Encarei a criança com os olhos arregalados. Se ela pudesse me ver aí sim ela se assustaria. Ela não parecia me ver. Ah, não. Olha o que eu fiz! Agora ela vai chegar em casa e falar para a mãe que uma voz mandou ela colocar um graveto ali para fazer uma casa de brinquedo. E daí a próxima coisa que você vai ouvir falar dessa pequena encantadora vai ser que ela foi a paciente mais jovem a ser internada com um quadro de esquizofrenia. Parabéns por arruinar uma vida, Alice.

Estiquei o braço e abanei minha mão em frente ao seu rosto. Nada. – Me ajuda?Eu acho que só sei montar casas mesmo...- puxei meu braço de volta rapidamente, como se ela fosse um bichinho selvagem pronto para me estraçalhar. Fiquei desse jeito, segurando meu braço por alguns minutos. Ela olhou em volta, na esperança de poder reconhecer de que corpo vinha a voz. Ih, amiguinha, esquece. Ela baixou a cabeça tristonha e começou a mexer nos gravetos.

Isso não estava certo. Era a primeira vez que alguém me ouvia e não me via. Eu precisava averiguar isso! – Claro que te ajudo. – o sorriso logo apareceu em seu rosto, e vi que tinha feito a coisa certa. Eu sabia como era triste não ter ninguém para brincar. Além de triste era um saco, mesmo. – Eu também não sou lá muita coisa, mas eu sei fazer uma vaquinha. Quer tentar? – Ela respondeu prontamente que sim.

Era difícil ajudar apenas falando o que fazer com os gravetos. Normalmente eu ajudaria montando junto. E não, eu não iria assustá-la com um bando de gravetos voadores se montando sozinhos em sua frente. Demorou um pouco, mas foi aí que eu percebi o quão esperta ela era. Em menos de cinco minutos ela já tinha feito quase uma fazenda inteira. Eu teria ficado ao seu lado por mais tempo se não fosse a chegada de quem eu menos queria ver na face da terra.

- Summer, que tal você ir para a casinha de brinquedos, hum? – Bom, o que eu posso dizer? Meu rosto desabou. Primeiro: ele conhece a menininha? Hm...Odeio enumerações. Sempre paro na primeira. Fiquei olhando para ele, com a boca entreaberta. Droga. Pelo tom de voz dava pra perceber que ele não estava muito feliz.

– Olha! Montei sozinha!!! – Ela levantou um monte de animais, pessoas e casas de gravetos nas mãos e mostrou orgulhosa. Apesar dos sorrisos e toda troca de carinho – e foi nesse momento que eu percebi que eles eram irmãos – ele não pareceu relaxar. Levantei e comecei a arrumar o vestido obrigada por não ficar presa neste mundo de camisola, evitando cruzar meu olhar com o dele. Quando terminei, cruzei meus braços e, decidida, olhei para frente.

Eu não sairia dali só porque ele havia nos presenteado com sua ilustre presença. Eu não tinha feito nada demais, oras. Tirando o episódio do banco, claro.