Não dá para acreditar que nunca mais iria ver os meus pais outra vez. Há menos de uma semana eles estavam comigo! E eu estava irritado com eles por que estavam insistindo para que eu fosse para Carmel visitar meus avós com eles. Cara... como a vida era... Não sei... Injusta? Num minuto as pessoas que você mais gosta estão do seu lado e a gente só consegue achar um saco... e no outro, quando já não estão mais ali só dá para pensar no quanto eu queria ter dito a eles que os amava. Eles morreram num acidente de carro quando voltavam de Carmel e agora eu fazia o mesmo caminho que eles, indo para a casa dos meu avós. Eu tinha reclamado de ir para a cidade de fim de mundo com eles e agora era obrigado a ir para lá por que o Sr. E a Sra Graffman eram meus únicos parentes próximos.
Olha, eu adoro os velhos. Sério! O que me irrita é essa cidadezinha ridícula e do tamanho de um ovo que não tem nada de interessante! Ok que a situação atual não colabora muito com o meu estado de espírito. E se mesmo quando tudo estava bem eu odiava a idéia de ir visitar a cidade, agora com a possibilidade de ter que morar por um bom tempo aqui me deixava completamente fora de mim. Eu havia ganho uma bolsa na UCLA, mas a aulas só começariam daqui a dois meses e eu nem sabia se os velhos iriam concordar que eu morasse em Los Angeles. Com certeza iriam querer que eu me inscrevesse na universidade local. Eu sabia que eles iam tentar isso a todo custo. Ainda mais que meu vô era amigo do reitor da universidade. Eles haviam me oferecido uma bolsa para jogar futebol pela Universidade Junipero Serra. Mas quem em sã consciência troca a UCLA pela universidade do fim do mundo?
Essas coisas todas ficavam martelando na minha cabeça enquanto o carro cruzava o Big Sur. Estávamos quase chegando ao meu purgatório particular. Pelo menos durante esses últimos dias nenhum fantasma idiota havia resolvido me atazanar. Eu fico pensando, eu vejo fantasmas o tempo todo e quando as duas pessoas mais importantes do mundo morrem elas nem sequer se dignam a aparecer para me dizer adeus decentemente. Ok... eu sei que provavelmente eles não devem ter deixado nada pendente, por que os que ficam sempre querem que eu resolva alguma coisa para eles. Mas meus pais tinham ido direto para a Luz. Que grande porcaria de ironia. Por isso eu digo que a vida era idiota, uma merda de injusta. Claro que eu pensei palavrões um pouco piores do que ”merda”, mas acho que é um pouco de falta de decoro escrever aqui exatamente o que se passava na cabeça nesse momento de raiva, pura e simples. Meus avós haviam percebido o meu silêncio, mas não disseram nada a viajem inteira, sorte, por que eu não estava com nem um pingo de vontade de falar.
A viagem não demorou tanto quanto pareceu, para mim pareceu uma vida inteira, mas na verdade foram só algumas poucas horas. Os dois estavam realmente se esforçando para me fazer sentir em casa e sei também que eles estavam sentindo a perda tanto quanto eu. Era o filho deles afinal, e eles realmente gostavam da minha mãe. Ela não tinha família e eles a haviam praticamente adotado como filha quando ela e meu pai se casaram. Então a coisa toda era bem ruim para todos nós, mas eles estavam tentando não parecer tão abalados por mim e eu sei que não estava ajudando muito.
Assim que entramos em casa minha avó me levou até a porta do quarto, claro que era o antigo quarto do meu pai. Eu conhecia bem aquele quarto, em todos os anos em que eu não havia aparecido em Carmel nada tinha mudado. Os mesmos pôsteres e troféus. Ele era bom em esportes como eu, conseguiu uma bolsa em Brown e então conheceu minha mãe. Assim que abri a porta do quarto senti aquele cheiro familiar, minha avó foi para a cozinha. Estava cansado da viagem e bem... Uma vantagem do meu pai ter sido filho único era que o quarto dele era uma suíte, então a primeira coisa que deu para fazer foi tomar um banho. Abri a mala para pegar uma toalha, logo de cara vi o retrato que tinha tirado com meus pais no natal anterior. Coloquei sobre a escrivaninha e fui tomar uma ducha. Essa sempre é aquela hora em que a gente coloca os sentimentos para fora. Eu realmente estava sentindo falta daqueles dois... Eles não podiam ter me abandonado desse jeito!
Depois do banho estava me sentindo um pouco melhor. Sai para o quarto enrolado na toalha com os pensamentos longe. Só que fui trazido para a realidade bem mais bruscamente do que havia imaginado. Tinha uma garota no meu quarto... e o pior é que era uma garota MORTA que estava com o meu porta-retratos na mão...
_ O que você quer? – bem eu não estava com saco... vamos direto ao assunto? – Putz... Nem agora eu tenho uma folga é? – falei mais como um desabafo...